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"O caso Carrère'“
Eu escreve: Dilemas da escrita de si. Org. de Gabriela Aguerre e Natalia Timerman
Record, 2025
clique na capa e conheça o livro no site da editora
Uma faixa azul-escura abraça a capa da nova edição francesa de um ensaio antigo de Emmanuel Carrère. “O real é apenas uma opção”, alardeiam letras brancas imensas na cinta, embaixo do título do livro: Uchronie. Nós, contemporâneos da pós-verdade, estamos acostumados com afirmações desse tipo - tudo são versões, narrativas etc. Estampada num livro de Carrère, no entanto, essa frase assumidamente marqueteira é também a ponta visível de camadas e camadas de reflexões que, por quase cinquenta anos, o autor francês acumulou. A realidade, suas instabilidades e seus pactos, suas representações e fronteiras na literatura são território conhecido de Carrère, e, por isso, uma frase assim soa como senha de entrada para se percorrerem muitas trilhas e caminhos em sua obra.
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Autores que integram a coletânea: Adriano Schwartz, Amara Moira, Andrea Saad Hossne, Anna Faedrich, Bianca Santana, Bruna Mitrano, Camilo Gomide, Diana Klinger, Felipe Charbel, Gabriela Aguerre, Ieda Magri, Isabela Cordeiro Lopes, Joselia Aguiar, Júlian Fuks, Júlio Pimentel Pinto, Lubi Prates, Luciene Azevedo, Mariana Delfini, Natalia Timerman, Samara Lima, Tatiana Salem Levy, Trudruá Dorrico, Yasmin Santos
O narrador de "Um romance russo", de Emmanuel Carrère, e a promessa da autobiografia
Dissertação de mestrado, sob orientação da prof. Andrea Saad Hossne, defendida no Departamento de Teoria Literária e Literatura Comparada (DTLLC) da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFFLCH-USP)
Nov. 2016
Em um contexto literário contemporâneo atravessado pela escrita de si, este trabalho buscou estudar a obra Um romance russo, de Emmanuel Carrère, à luz das propostas da autobiografia e da autoficção, esta última uma expressão que convoca diferentes definições e justificativas. Para isso debruçou-se sobre a construção do narrador-protagonista, que declara ter como objetivo contar a história de seu avô para romper o silêncio em torno dela, imposto por sua mãe, e, assim, enterrar o fantasma desse homem que continuaria assombrando seus descendentes com sua personalidade amarga.
Observamos que o narrador, identificado ao autor, faz uso da metonímia em diferentes instâncias da obra: alinhava narrativas menores que remetem ao mesmo tema, apresenta personagens femininas que remetem à figura materna e o próprio protagonista se constrói em espelhamento com o personagem do avô. Tal recurso, somado a duas narrativas que se entrelaçam, organizando o texto de Um romance russo, age como argumentação em favor de seu objetivo, justificando a necessidade de romper com a proibição da mãe e publicar este livro.
Pela responsabilidade implicada na reabilitação da figura do avô, seguindo os moldes do que o crítico Dominique Viart propõe para o récit de filiation, e pela performatividade que objetiva, além das referências sem ambiguidade em seu texto, Carrère estabelece um pacto autobiográfico, como estudado por Philippe Lejeune, que é essencial para a leitura de Um romance russo.
Acreditamos que, embora o gênero moderno da autobiografia não se aplique nem a esta, nem a obras anteriores do mesmo autor, um autobiográfico percorre todas elas, recusando as possibilidades de pacto romanesco com que joga a autoficção; ainda, identificam-se em sua produção elementos como o uso comentado da psicanálise, incursões ficcionais demarcadas no texto, estruturas fragmentárias e hibridismo de formas que situam Carrère no debate contemporâneo.
"Trauma de família e hereditariedade: espelhamento nos personagens de Um romance russo, de Emmanuel Carrère"
Memória e trauma histórico: literatura e cinema. Org. de Andrea Saad Hossne e Sandra Nitrini
Hucitec, 2018
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Em Um romance russo, Emmanuel Carrére (2007) entrelaça duas narrativas a respeito de eventos que percorreram cerca de dois anos de sua vida, um relacionamento amoroso conturbado e as filmagens de um documentário na pequena cidade de Kotelnitch, no interior da Rússia. Concomitantes, as narrativas se relacionam pelo protagonismo do autor em ambas. Um terceiro elo é essencial para o tom de cada uma delas e do livro como um todo: trata-se de uma narrativa de fundo, aquela que reconta a trajetória do avo do autor, Georges Zourabichvili. Sua história, cuja transmissão pelas gerações seguintes da família seria problemática, segundo o autor, é o fundamento da obra: ela justifica sua publicação.